“Dignidade menstrual é direito garantido: absorventes gratuitos para pessoas de baixa renda salvam vidas e rompem barreiras.” Com essa premissa, a Lei 14.214/2021 estabelece que pessoas que menstruam em situação de vulnerabilidade social possam receber absorventes sem custo como parte de políticas públicas de saúde e direitos humanos. A nova norma reconhece que a pobreza menstrual — a falta de acesso a produtos básicos de higiene no período menstrual — é uma grave desigualdade que afeta a educação, a saúde e a participação social de milhões de brasileiras.
Neste artigo, vamos destrinchar o que a lei determina, quem são seus beneficiários, como acessar o benefício, os avanços e desafios — e por que essa medida é uma resposta concreta e simbólica à desigualdade de gênero.

1. Contexto: pobreza menstrual como problema social
- Definição: pobreza menstrual (ou precariedade menstrual) refere-se à impossibilidade de acesso a produtos de higiene menstrual — como absorventes descartáveis, água, sabão ou instalações sanitárias adequadas — durante o ciclo menstrual.
- Impactos: esse problema gera absenteísmo escolar e laboral (uma em cada 4 meninas já falta à escola no Brasil durante o período menstrual) ; acometimento da saúde íntima, uso de materiais improvisados com risco de infecções, estigmas sociais e sensação de vergonha ou exclusão.
- Reconhecimento internacional: o direito à higiene menstrual foi reconhecido como componente de dignidade humana e gênero pela ONU e organizações de saúde global.
Esse pano de fundo justifica por que tornar absorventes acessíveis a quem não pode arcar com eles é, acima de tudo, uma ação de justiça social.
2. O que determina a Lei 14.214/2021
- A lei institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual com o objetivo de assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos e outros cuidados básicos de saúde menstrual.
- Também altera a Lei 11.346/2006 para determinar que cestas básicas distribuídas no âmbito do SISAN (Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional) incluam absorventes como item essencial.
- A lei prevê que órgãos de saúde, educação, assistência social e segurança pública atuarão de forma integrada para executar o programa.
- Ainda na lei está previsto que absorventes produzidos com materiais sustentáveis tenham preferência nas licitações, em igualdade de condições.
Vetos e restauração pelo Congresso
- Quando sancionada, a lei sofreu vetos presidenciais, inclusive do dispositivo que previa a distribuição gratuita dos absorventes, sob o argumento de ausência de fonte de custeio.
- Em 2022, o Congresso Nacional derrubou os vetos, restaurando esses dispositivos e promulgando a lei com texto completo.
- Somente com o Decreto 11.432/2023 é que o programa foi regulamentado, detalhando os mecanismos de implementação.

3. Regulamentação e operacionalização: o que diz o decreto e as portarias
- O Decreto 11.432/2023 regulamenta a Lei 14.214/2021, definindo diretrizes, responsabilidades e estruturação do Programa de Proteção e Promoção da Saúde e Dignidade Menstrual.
- Em 2024, a Portaria GM/MS nº 3.076/2024 estabelece critérios, procedimentos e monitoramento da disponibilização gratuita de absorventes pelo Ministério da Saúde.
- A portaria define público-alvo, periodicidade, protocolos de distribuição e obrigações de monitoramento e controle.
- A partir de janeiro de 2024, o programa passou a contar com distribuição via Farmácia Popular credenciada, em 31 mil unidades espalhadas por todo o país.
- A Portaria também exige que os beneficiários cumpram alguns critérios determinados (por exemplo, cadastros sociais, documentos exigidos).
4. Quem tem direito e como acessar
Beneficiárias
Conforme lei e regulamentações, têm direito ao benefício:
- Estudantes de baixa renda matriculadas em escolas públicas (fundamental e médio).
- Pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade social extrema.
- Mulheres presas ou apreendidas, recolhidas no sistema penal.
- Mulheres internadas em unidades socioeducativas.
Adicionalmente, os beneficiários precisam estar entre 10 e 49 anos, ter CPF válido e estar inscritos no CadÚnico para programas sociais, conforme critérios definidos pelo Ministério da Saúde.
Quantidade e frequência
- Cada pessoa pode retirar 40 unidades de absorventes para uso durante dois ciclos menstruais — o que significa uma autorização a cada 56 dias.
- A autorização precisa ser gerada via Meu SUS Digital (app ou portal), e o documento vale por 180 dias (depende do regulamento local).
Procedimento para retirada
- Gerar a autorização do Programa Dignidade Menstrual no app/site Meu SUS Digital.
- Ir até uma farmácia credenciada (Farmácia Popular) que participa do programa.
- Apresentar documento de identificação com foto + CPF + autorização gerada.
Em casos de dificuldade digital, as UBS (Unidades Básicas de Saúde), CRAS e equipes de assistência social devem orientar e auxiliar no acesso ao benefício.
5. Avanços, desafios e limitações
Avanços
- O estabelecimento legal do direito à distribuição gratuita de absorventes representa uma vitória simbólica e prática para a igualdade de gênero e o reconhecimento da menstruação como questão de saúde pública.
- A integração entre diferentes esferas (Saúde, Educação, Assistência Social) fortalece uma abordagem intersetorial.
- A utilização da rede Farmácia Popular amplia a capilaridade do benefício e facilita o acesso nas comunidades.
- A lei também impõe a inclusão de absorventes em cestas básicas do SISAN, reforçando o caráter essencial desses produtos.
Desafios e lacunas
- Fiscalização e monitoramento: garantir que os kits cheguem efetivamente às beneficiarias sem falhas ou desvios.
- Capacidade logística local: unidades remotas ou com infraestrutura precária podem ter dificuldades para armazenar ou distribuir os absorventes.
- Desigualdades regionais: estados e municípios com menor capacidade administrativa e orçamentária podem enfrentar maiores obstáculos para implementação.
- Limitação de público-alvo: algumas pessoas que menstruam e estão em situação de vulnerabilidade podem não se enquadrar nos critérios definidos, ficando excluídas.
- Desinformação: muitas beneficiárias potenciais ainda desconhecem seus direitos ou o procedimento para acessar o benefício.
- Sustentabilidade financeira: ainda há discussões sobre fontes permanentes de recursos para manter o programa no longo prazo.
6. Porque essa lei importa: impacto social e simbólico
- Ao garantir absorventes gratuitos, o Estado reconhece a menstruação como uma questão de saúde, direito e dignidade humana, não apenas uma demanda privada.
- Reduz barreiras para a educação de meninas, prevenindo faltas por falta de produtos de higiene menstrual.
- Ajuda a diminuir o estigma menstrual, promovendo a informação e a normalização da menstruação nas escolas e comunidades.
- Afirma a responsabilidade pública na garantia de direitos de gênero e assistência àqueles mais vulneráveis.
Palavras-chave:
dignidade menstrual, absorventes gratuitos, Lei 14.214/2021, pobreza menstrual, vulnerabilidade social, programa saúde menstrual


